segunda-feira, 14 de novembro de 2011

E lá vem o vento.. Cuidado Dio, feche a janela!

VENTO

Acordo incomodado com o barulho do vento embandeirando as árvores da chácara. É monótono, as rajadas quase compassadas, repetitivas, a farfalhar prenunciando alguma coisa soturna. No entanto, é manhã, talvez o sol ainda dê o ar de sua graça, e quem sabe o vento cesse, para que eu possa magicar e produzir pelo dia adentro.
Vento me irrita. Meu pobre cérebro de cronista laborioso, mas sem imaginação, sofre com sua persistência e se descontrola a ponto de inutilizar qualquer tentativa de trabalho sério. Ansioso, fico com medo que aumente e, nestas terras próximas ao Paraíba, rasas e abertas, venha causar danos que já presenciei de outras vezes, quando vizinhos são destelhados, velhas coníferas se partem e desabam sobre a alta tensão, minha safra de mangas vai pro bagaço. Bem sei que é tolice esbravejar, mas resistir, quem há dê?
Preocupa-me o passadio dos gatos, em seu reduto que se estende por três ou quatro platôs acima da casa. Estarão encolhidos, amontoados uns sobre os outros na área coberta, inconscientes do perigo de galhos e grandes frutos que se podem saltar e cair sobre eles. Penso nos cães, a esta hora deitados de costas para as rajadas ou esgueirando-se para o canil, aberto se o vento não lhe bateu as portas. E os passarinhos, onde se abrigarão? E o casal de gambás e seus gambazinhos, como estarão se virando? Com certeza, quem menos teme é o lagarto lá do pomar, pois tem sua toca onde se recolhe em segurança. Maldito vento!
Abandono a esperança de uma calmaria, lavo a cara para acordar de vez e desço até a venda da pracinha, a fim de um quente. Lá, pelo menos, o ruído não é tão forte, já que as árvores se distanciam. Ainda aborrecido, lamento-me e indago, assim à toa, por que venta tanto. Um companheiro, judicioso, me diz que é porque é tempo de pipa.Bom, a lógica é inatacável; venta muito, porque é tempo de pipa. Mas a explicação não me consola, que pipa nunca foi distração das minhas, sempre achei um negócio meio bobo, e mais agora, que já dobrei o cabo, não me ficará bem correr pelaí, para me conciliar com Éolo.
Torno a casa. As galharias drapejam. Meu humor segue horroroso. Gatos, cães e eu sofremos. Talvez que o vento vá embora, levado nas próprias asas. E aí saberei que prejuízo deixou, além dos meus nervos em frangualhos. Sensibilidade exarcerbada, dirão. Não é certo. Mais próximo anda isto do cagaço. Cagaço de quem nasceu e foi criado na selva de cimento armado, longe de bucolismos reais ou simplesmente literários. Encolho-me, fetal, desisto de ser pensante e procuro o sono do esquecimento. Esquecerei este vento, até me acordar de novo. Maldito seja!.

Jornal da Cidade - Barra do Piraí 24.07.99

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